Por Bárbara Calmeto, neuropsicóloga e diretora do Autonomia Instituto
Em tempos em que as pessoas com autismo, independentemente da idade, ainda são descartadas do mercado de trabalho, sofrem bullying e têm dificuldade de receber educação inclusiva nas escolas e universidades, é fato que o mercado tenta lucrar e aproveitar o tema da inclusão para gerar meios de se apoderar de estereótipos sociais e gerar marketing sobre ideias erradas e capacitistas.
As pessoas falam sobre o assunto, de forma geral, carregadas de clichês. Alguns afirmam que ser autista é sinônimo de genialidade, enquanto outros que sempre há incapacidade de comunicação social. E isso não é verdade. Há, sim, casos em que essas características acontecem, mas não é um regra. De forma alguma.
Portanto, é muitíssimo importante que a sociedade entenda que o diagnóstico de autismo demanda muita investigação multidisciplinar. Afinal, é feito de forma clínica e não há um exame laboratorial. Ou seja, um especialista apenas não será capaz de fechar um diagnóstico de TEA sozinho, mas será necessário um cruzamento de dados de profissionais diferentes especialidades, médicos e terapeutas qualificados na área, que, durante a avaliação, vão observar comportamentos esperados para faixa etária e outros que têm as características do autismo.
Esmiuçando o que disse acima, isso quer dizer que nem todo autista tem dificuldade para olhar nos olhos ou é intolerante ao toque, assim como nem todo autista tem altas habilidades em Matemática ou tem TOC. Há uma diversidade imensa que vai muito além dos três graus de suporte no espectro. Afinal, há seres humanos com características particulares, histórias individuais e interesses diferenciados, só para falar no básico. E o mesmo acontece com quem é diagnosticado com autismo. Aliás, é preciso dizer que, além de não existir “jeito de autismo”, também não existe cara de autista, e não é possível diagnosticar ninguém olhando no rosto da pessoa.
O autismo é um transtorno do neurodesenvolvimento e isso significa que um indivíduo já nasce autista, não se torna autista por alguma situação vivida na vida. O que acontece é que, em alguns casos, a família não percebia os sintomas e, por volta de 18 meses, com a poda neural, os sinais ficam mais visíveis e o atraso na fala é o primeiro que realmente chama atenção. Infelizmente, ainda há a famosa e terrível frase que alguns pediatras usam “Cada criança tem seu tempo”, porque isso só atrasa o possível diagnóstico e a intervenção precoce, que são preditores para melhores resultados.
Portanto, falar que o autismo virou a tendência do momento não é apenas equivocado sob o ponto de vista da informação errada, mas extremamente absurdo (para dizer o mínimo) com as famílias que estão buscando fechar o diagnóstico de suas crianças e com os autistas que tentam, constantemente, vencer os preconceitos que a sociedade já os imputa. O que acontece hoje é que, diferentemente de alguns anos atrás, há uma maior divulgação sobre o tema, seja na grande mídia ou pelo compartilhamento da rotina por suas famílias ou até mesmo por pessoas com autismo nas redes sociais. Outro ponto é que existem mais ferramentas e informações que favorecem o diagnóstico precoce.
A notícia boa é que enquanto alguns disseminam informações erradas como “autismo virou moda”, as gerações mais novas parecem já vir dotadas de maior empatia e conhecimento. Não é raro, inclusive, encontrar mais ambientes inclusivos com crianças inseridas socialmente. Para entender o que estou dizendo, basta para nós, adultos, puxarmos da memória quantas pessoas com deficiência convivíamos na nossa infância e quantas nossos filhos conhecem hoje, por estarem inseridos na sociedade e não frequentando apenas espaços especializados. O mundo mudou, a sociedade está mais atenta e as pessoas com autismo merecem respeito, empatia e inclusão.